Fé: um santo remédio no caminho contra as drogas
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define saúde como bem-estar físico, mental, social e espiritual. E frisa: todo paciente tem direito de cuidar também de seu espírito. Quem trata de pessoas que lutam contra o vício das drogas sabe o quanto a fé pode ser, literalmente, um santo remédio. Não importa o tipo de credo. Todas as instituições religiosas ouvidas pela reportagem na última semana, entre católicas, evangélicas e espíritas, fornecem suporte espiritual para problemas desse tipo. São centros de recuperação bucólicos, localizados geralmente no interior do Estado.
Mesmo entre os médicos, se antes a influência da espiritualidade na saúde era motivo de discórdia, hoje o assunto é tratado com naturalidade. Instituições tradicionais, como Universidade de São Paulo e Universidade Federal de São Paulo, já contam com setores específicos para estudar a força da fé sobre o corpo.
O médico Roque Saviolini, cardiologista do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (Incor), afirma que existem mais de mil artigos científicos sobre os benefícios da fé para a saúde. Só ele já escreveu 14 livros sobre o tema. “Grande parte desses estudos científicos comprova que o paciente que tem alguma espiritualidade ou religião adere melhor ao tratamento da doença, seja ela qual for. Ele aceita a sua enfermidade e a enfrenta de maneira mais positiva, o que colabora diretamente para a sua recuperação”, explica o médico.
“Os códigos morais de boa parte das religiões apregoam hábitos saudáveis e isso propicia menos doenças nessas pessoas”, acredita Frederico Leão, responsável pelo Programa de Saúde e Espiritualidade do Instituto de Psiquiatria da USP.
Para Leão, a pessoa que tem alguma religiosidade acaba buscando naturalmente um estilo de vida saudável. Além disso, há o suporte social gerado pelas instituições, que propicia às pessoas o sentimento de acolhimento, de pertencimento ao grupo. “Com isso, o usuário de drogas enfrenta o problema com positividade, como se aquilo fosse apenas uma passagem a superar.”
Em recuperação em uma instituição evangélica, Felipe Cirne, de 27 anos, não tem dúvidas sobre o poder medicinal da espiritualidade. “Lá fora não tenho como ter um psicólogo a qualquer hora, um psiquiatra para me receitar um remédio. Mas Deus está sempre acessível, posso falar com ele 24 horas”, diz.
Uma das dificuldades, dizem os profissionais, é encontrar um equilíbrio entre os remédios para o corpo e para a alma. “Não adianta só tomar remédio, mas não adianta espiritualizar demais”, analisa Leão. A necessidade de um bom diálogo entre fé e medicina foi sentida por Vilson Disposti, de 51 anos, ao fundar a Casa do Caminho Ave Cristo, clínica espírita localizada em Birigui, no interior do Estado. “Quando abri a casa, em 1991, a ideia era usar só o espiritismo contra o vício, mas percebi que muitos desistiam do tratamento. Na fase de abstinência, por exemplo, ficavam muito alterados e chegavam a fugir.”
Disposti, que agora cuida dos pacientes junto com o neurologista Sérgio Irikura, conta que o lugar é uma espécie de fazenda, onde os pacientes cuidam da horta e dos animais. As instalações da Comunidade Terapêutica Conquista, que segue a visão cristã evangélica, também tem ares campestres. Ali, os pacientes ficam internados por nove meses, no mínimo. Fazem orações, cuidam da horta e praticam laboterapia, o que inclui a criação de chaveiros de biscuit e o preparo de comida ou pães caseiros. Há também lazer na piscina e pescaria.
No prédio da católica Associação de Recuperação Guedes e Caprio, em Peruíbe, há quadras, piscina e capela. Os pacientes passam por sessões de musicoterapia, além de atendimento com psicóloga e psiquiatra. “Percebo que a religião ajuda muito. Quando não se acredita em nada, é diferente”, diz a psicóloga do espaço, Caroline Lagoizar.
Fonte: Estadão
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